O Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege) publicou uma nota técnica em que chama a atenção para a ausência de dados oficiais atualizados sobre a ludopatia e pede regras mais rígidas para a publicidade das bets.
Na visão da entidade, a legislação atual “ainda padece de significativas lacunas no que tange ao controle de práticas publicitárias abusivas”. Um dos motivos está relacionado com a ampla exposição do público, incluindo grupos vulneráveis, à publicidade das empresas de apostas, afirma o Condege.
“As empresas do setor são intensivas em dados: utilizam informações de navegação, histórico de apostas, localização e perfis em redes sociais para direcionar anúncios sob medida, em tempo real, aos potenciais interessados. Por meio de cookies, trackers e parcerias com plataformas como Google e Facebook, as casas de apostas conseguem identificar usuários que demonstraram interesse em apostas (por exemplo, visitaram sites de tips, seguiram páginas de futebol, ou até pesquisaram por ‘como ganhar dinheiro rápido’)”, alega a entidade.
Na nota técnica, o Condege sugere ações a serem tomadas pela Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) do Ministério da Fazenda em parceria com outros órgãos. As recomendações incluem:
Edição de norma complementar que proíba expressamente a aquisição ou o licenciamento de direitos de denominação de eventos ou equipes esportivas por empresas operadoras, em consonância com o art. 18 da Lei 14.790/2023;
Previsão de mecanismos que limitem ou proíbam a exibição de logomarcas de apostas em uniformes, produtos esportivos ou peças de divulgação, a fim de evitar a associação direta com públicos infantojuvenis, considerando que tais produtos chegam facilmente às mãos de crianças e adolescentes;
Fixação de faixas horárias específicas para veiculação de anúncios de apostas em meios de comunicação (TV, rádio ou streaming) que transmitam eventos esportivos. O modelo espanhol e o enquadramento da Classificação Indicativa do Ministério da Justiça servem de referência para afastar a propaganda de horários de grande audiência infanto-juvenil;
Proibição de comissionamento calculado com base no montante perdido pelo jogador, de modo a coibir o interesse econômico em estimular apostas arriscadas. Recomenda-se também obrigar o operador a informar claramente nos anúncios, nos casos em que a relação contratual operador/afiliado assim autorizar, que o influenciador/afiliado recebe remuneração caso o consumidor jogue e perca;
Inibir o envolvimento de influenciadores "de alta penetração juvenil", àqueles com apelo à cultura jovem, ou àqueles que pelo seu posicionamento de branding ou idade inferior a 25 anos, mesmo que tais influenciadores não se dirijam explicitamente a menores, a presença massiva de seguidores jovens justifica uma vedação objetiva, em linha com precedentes internacionais (Ontário, Canadá; UK Advertising Code);
Proibir o direcionamento de publicidade de apostas a usuários identificados como vulneráveis, seja por histórico de autoexclusão, inadimplência grave, idade inferior a 21 anos ou uso de expressões associadas à busca de soluções financeiras de urgência (como "preciso de dinheiro rápido"). Esse ponto exige cooperação entre a LGPD (Lei nº 13.709/2018) e a regulação setorial, garantindo que dados sensíveis não sejam explorados para fins de persuasão comercial em jogos;
Tornar obrigatória, em qualquer publicidade digital de apostas, a inclusão de um link ou canal de fácil acesso para que o usuário se oponha à recepção daqueles anúncios, inclusive quando exibidos em plataformas de terceiros (YouTube, Instagram, etc.).
A íntegra da nota técnica, com todas as medidas propostas pelo Condege, pode ser lida neste link. A entidade representa as defensorias públicas existentes no Brasil.
No final de maio, o Senado aprovou o substitutivo (texto alternativo) do projeto de lei 2.985/2023. A proposta possui semelhanças com as medidas defendidas pelo Condege ao estabelecer novas restrições para as propagandas de bets. O texto, bastante questionado pelo setor de apostas, aguarda agora tramitação na Câmara dos Deputados.