O Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict) divulgou um relatório que analisa a forma como as apostas online são apresentadas no ambiente digital, identificando práticas capazes de gerar danos ao consumidor. A pesquisa coletou dados do Facebook, Instagram, X (antigo Twitter), YouTube e grupos públicos abertos no Telegram.
No YouTube, os autores do estudo constataram a existência de propagandas de apostas em canais voltados para o público infantil. O relatório cita especificamente o canal Gah Marin, com conteúdo sobre games infantis populares, como Minecraft e Roblox.
“Embora crianças e adolescentes sejam o público alvo do canal, foi observado que ele faz uso do recurso de transmissão ao vivo para promover conteúdos de jogos de azar, como o Fortune Tiger, exibindo a suposta obtenção de grandes prêmios em dinheiro e buscando atrair seu público para o universo das apostas”, aponta o estudo do Ibict.
“A opção por deixar este tipo de conteúdo restrito às transmissões ao vivo possivelmente se dá porque ela não permanece listada no Canal, o que possibilita que conteúdos publicados, ainda que questionáveis ou até mesmo ilegais, não possam ser rastreados ou verificados”, continua o relatório.
No chat ao vivo, são disponibilizados links que levam a um site de apostas ausente da lista de empresas autorizadas pelo Ministério da Fazenda a atuar no período de adequação que foi até 31 de dezembro de 2024 - tratando-se, portanto, de uma plataforma ilegal.
O canal citado pela pesquisa não está mais disponível, mas os autores do relatório gravaram uma das lives com divulgação de apostas para o público infantil. O vídeo pode ser visualizado neste link.
Nas lives, é utilizada a promessa de ganho fácil a partir da suposta identificação de um bug ou de estratégias que permitiriam o lucro em sites de apostas. Há canais também que promovem as bets como forma de renda extra, diz o estudo, contrariando a ideia defendida pelo mercado regulado e por especialistas de que o jogo é entretenimento, não fonte de renda.
Ao analisar o Telegram, o estudo afirma que o aplicativo “viabiliza o fácil acesso a grupos e canais relacionados a casas de apostas, como evidenciado na busca pelo termo Tigrinho, em que rapidamente se encontram diversas comunidades dedicadas a esse tema”.
Após o usuário ingressar em um grupo voltado a cassinos online, o próprio Telegram começa a recomendar outras comunidades com a mesma temática, independentemente se são apostas legais ou ilegais, aponta o estudo.
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“Um único grupo relativamente pequeno atua como um portal para uma rede consideravelmente maior de comunidades que operam com práticas ilegais, fornecendo inclusive ferramentas que funcionam dentro do Telegram para a prática do ilícito, expondo um ciclo contínuo de captação de novos membros e a potencialização do impacto dessas práticas nocivas”, diz a pesquisa do Ibict.
“Plataformas como o Telegram desempenham um papel central na divulgação e no impulso ao acesso às apostas ilegais, configurando-se como um catalisador para a expansão dessas práticas. A combinação de mecanismos de busca sem filtros adequados, recomendações automáticas de canais similares e a ausência de moderação eficaz cria um ambiente favorável à proliferação de grupos, canais e bots relacionados a apostas, ignorando regulamentações e permitindo que redes ilegais alcancem milhares de usuários com facilidade”, ressalta o relatório.
Os autores destacam o fato de que até mesmo usuários em busca de apostas legalizadas são apresentados e estimulados a ingressar em grupos com divulgação de plataformas clandestinas.
De forma geral, a análise do instituto aponta para a existência de ampla desinformação sobre bets no mundo digital e de conteúdo nocivo aos direitos difusos (aqueles pertencentes a uma massa não identificável), em especial os direitos do consumidor.
“O estudo foi conduzido a partir de dois recortes: mídias e redes. Essa divisão deu-se pela característica de acesso aos conteúdos das diferentes plataformas. Para as mídias, foram coletadas 86.107 ocorrências entre os dias 04/10/2024 e 02/12/2024. Nas redes, foram extraídas 115.100 publicações a partir da expressão de busca das bets e apostas ilegais. As primeiras referências ao termo remetem a maio de 2016 e foram coletadas postagens até novembro de 2024, contemplando uma ampla gama de comunidades públicas e abertas que totalizam mais de 2,5 milhões de usuários brasileiros”, explicam os autores da pesquisa.
O relatório completo, com todos os dados, está disponível neste link.